quinta-feira, 18 de agosto de 2011

POR QUE ESCREVER?


            A escrita é uma subversão da realidade. As fissuras existentes entre as palavras tão bem encadeadas levantam questionamentos sobre os seus sentidos e os sentidos da mensagem. Entre uma palavra e outra, o leitor cria significados muito pessoais. Ou seja, a cada leitura de três palavras, acontece uma interpretação de acordo com o repertório intelectual de cada um. Semelhante às respirações mais profundas, continuamos passando o nosso olhar pelo papel e lendo, ininterruptamente, até porque o suporte livro ainda concentra todo o encantamento da vida diária. Se somos escritores ou não, a verdade é que, ao escrever, embutimos, nas palavras e em suas ligações semânticas, significados ponto a ponto, como se quiséssemos, antes de tudo, nos entender.
Toda a nossa literatura é um poço fundo de “quereres” guerreiros, estéticas múltiplas e possibilidades românticas que, segundo o poeta Tristan Tzara, em carta a Breton, pode ser resumida na seguinte afirmativa: “se escrevemos, é apenas por refúgio de todo ‘ponto de vista’. Não escrevo por profissão”. Eu também não! Alguns escrevem por fraqueza, outros para abreviar o tempo, outros ainda por pura exposição e outros ainda mais, por desejar a eternidade. Deve-se escrever, em princípio, para viver!
A ação de escrever deduz uma sedução e um estranhamento sobre a realidade ou quanto à própria existência. Logo, “Por que escrever?”, segundo diferentes autores, é uma questão tão complexa quanto perguntar “qual é o sentido da vida?”. Ambas não são perguntas a que possamos responder à queima-roupa. Ambas, por sinal, não são perguntas as quais precisamos responder. Apenas as vivemos por natureza. É o nosso processo de vida.
            Se escrevemos por obrigação (por exemplo, uma monografia) ou por vontade, de qualquer jeito, escrever amplia as percepções, age por confrontação quanto ao já sabido (senso comum) e suscita aprimoramento do próprio ato de escrever. É a memória sendo fortemente ativada. É a ficcionalidade causando deslumbramento sobre a observação cotidiana.
Alguns escritores aceitam o pedido do destino e se esvaem em letras naturalmente. É uma questão do gosto. Outros criam propostas de escritas, como forma de relacionamento com a realidade. Em todos um elã racional e emocional consigo e com o mundo. É uma questão profissional (acadêmica?). Em voz alta ou no silêncio do quarto, os “escritores” aceitam a magia da inspiração e do talento, e espalham seus imaginários em meio às nossas tantas formas simbólicas (letras).
A escrita, assim tem sua utilidade efetivada na socialização e na paixão. É aprendizagem, tem significado e jorra emoção. Mas também é possível escrever por divertimento, por alegria, até exaurir-se na criação de um traçado, às vezes, insólito, de tantas vidas e aventuras. Aceitar a aposta de escrever, depois que a memória for atingida por algo desconhecido (superior?), é passar o tempo escavando suas questões em profundidade até clarear as idéias, até entender-se.
De qualquer jeito criam-se encontros com complexos novelos em busca de desvendamento. Lya Luft, então, diz “escrevo para seduzir meus leitores que sejam cúmplices na inquietação fundamental, na busca de entender o mundo – e jamais o entenderemos.” O tempo todo, então, o escritor objetiva, em seu planejamento, “uma releitura dos valores familiares e sociais” de cada tempo, na intenção de esclarecer o próprio tempo. Para essa autora e tantos outros mais, a literatura “pode e deve ser lida como uma denúncia da hipocrisia, da superficialidade, da indiferença, da negligência e da mentira nas relações humanas, amorosas e familiares”. Em verdade, escrever é ratificar a idéia de que existimos.
            Não há, enfim, uma razão para escrever. Como tudo o que fazemos, é fundamental o acontecimento, qualquer evento cotidiano que nos incomode em qualquer nível ou aspecto. Este evento desequilibrante gera o impulso, ou seja, uma vontade de “falar”, de entender e de exposição, via explicação, do que nos aconteceu. Sartre, nesta hora, nos ajuda, dizendo: “o problema não é o que fizeram conosco, o problema é o que fazemos de nós com o que fizeram conosco.” Este impulso não tem natureza identificável, mas nos espanta, nos tira do prumo e, dependendo da formação, cria uma das mais tradicionais formas de esvaziamento de si: a escrita e, por conseqüência, o texto.
Sabemos que muitos se exprimem de diferentes maneiras como, por exemplo, pelo desenho, pela pintura, pela música, todas são linguagens cuja mensagem investe numa provocação à uma mudança tanto interior quanto exterior. Mas acordamos com Alexei Bueno: o prazer lúdico de combinar palavras e fazer arte, “livra-nos do egoísmo, praga suprema da espécie e forma geral de estupidez.” Escrever alivia nosso cérebro reptiliano, mais agressivo, violento e/ou pernicioso.
            Diante disso, leitor, quando for escrever seu post, artigo, monografia, dissertação ou tese, lembre-se: o cotidiano é seu melhor laboratório de idéias. Observe-o com atenção. E se pergunte: o que incomoda? Que ponto pode ser revisto? Que atitudes podem ser melhoradas? Que conceitos precisam ser repensados? Anote. Rascunhe. Converse. Ainda que o tempo seja curto e suas atividades semanais sejam muitas, aprecie o seu entorno fazendo silêncio de si mesmo. O resultado será uma escrita compromissada, coerente e de acordo com o seu movimento na vida.
E aí, seja feliz sempre! Força!

 Profa. Ms. Claudia Nunes
http://e-pesquisadora.blogspot.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário