quarta-feira, 17 de junho de 2015

FAXINE-SE

Fim do ano. A aura do tempo começa a mudar de cor. De um vermelho intenso ao branco iluminado, os pensamentos estão abertos às promessas, às escolhas, às imaginações. Em casa, o olhar assume uma tarefa: faxina. No corpo, coração e mente querem mais espaço para viver novas (a)ritmias. Se é difícil se transformar, que tal mudar os objetos de lugar? No armário dos cômodos da casa e nas gavetas do cérebro, tudo o que estiver socado deve sair, se abrir, ganhar outros usos ou mesmo chegar ao lixo, sem titubeações. Roupas, sentimentos, livros, ideias, papéis, certezas têm sua hora de renovação. É uma luta. Desapegar é uma dor. Assusta pensar em mexer nas coisas. De cada porta aberta surgem memórias de outros tempos. Problemas, profissões, ações, a rotina da vida está guardada como lembrança querida, mas no fundo, quanta inutilidade, quanto peso! Faxina necessária! Faxina intranqüila! Faxina cautelosa! Depois do olho, a mão invade a escuridão e começar a tirar as coisas do lugar. Tanto a alma quanto armários e gavetas vão se esvaziando. Nada passa sem o crivo do olhar, da lembrança e do olfato. É..., o olfato é um bom vetor das outras vidas, preste atenção! Em cada respiração, em cada suspiro, as energias alcançam espaços importantes. Faxine os livros que não leu. Faxine os bibelôs que os amigos desaparecidos ofertaram. Faxine a falta de piedade. Faxine as impaciências. Faxine o mau humor. Faxine as músicas insensatas. Faxine os atrapalhamentos e desarmonias que colocaram diferentes amigos num horizonte sem fim. As atitudes devem dar plasticidades às promessas, ao fluxo dos novos encontros, ao peso de outras posturas. Se o amor não deu certo, se o trabalho está estagnado, se emagrecer é difícil, se uma amizade resiste a um retorno, se não se consegue compreensões, se não se deseja ir ao cinema, esquece! O corpo não é um baú de ossos antigos. Faxine-se! Com dois braços, alcance múltiplos espaços e traga as novidades, sejam quais forem. Em um ano, se vc não se tocou ou foi tocado, faxine-se! Não há culpa, não assuma depressões, doe-se! As paredes devem ser vistas. Os neurônios devem realizar novas sinapses com mais liberdades. As mãos devem tocar outras pessoas sem asperezas. As prateleiras devem ter lugar para outros objetos. Casa e corpo não são museus com links paralisados pelos tempos. Em um ano, a vida acumulada já apresenta data de validade? Aquela dor precisa de outro remédio? As faces precisam de outros cosméticos? O corpo precisa de outro perfume? As revistas têm textos desatualizados? Aqueles jornais não servem mais? Faxine-se! Lustre-se! Gotas de cânfora diluída em álcool e... energize-se! Não leu, não amou, não foi amado, perdeu oportunidade, fez silêncio? Esquece! Gotas de amoníaco na água e... devaste os (pré)conceitos! Para cada esvaziamento, outros aromas, sorrisos, opções, desejos. É esse toque especial que diminui a tensão de tantos sacos cheios de lixo no chão das lembranças. Não duvide da própria capacidade. Não desista por antecedência. Não canse. Dos absurdos, insólitos e desconhecidos também se tem a possibilidade de recomeçar. Faxina é a chance de ir além de um esboço de si mesmo. Faxina é a oportunidade de revisitar-se. Faxina é a retomada do que é simples, prazeroso e agradável em todo lugar. Já tentou um novo cabelo? Uma nova amizade? Um novo caminho? Um novo sentimento? Uma nova aproximação? Outro silêncio? Outra escuta? Outro abraço? Outra verdade? Experimente e reinvente-se. No fim do ano, pense grande, pense melhor, pense na luta, pense nas pessoas, pense no futuro e reinstale no cotidiano o frescor da alegria, da paixão, da liberdade. No fim de tudo, de cima para baixo, a leveza vai lhe encarar e perguntar: vamos nos emocionar de novo?
Claudia Nunes



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